mergulho a esmo na via Anchieta

   (...)Naquela tarde dos tempos dos laquês nos cabelos fazia um sol fraco,sol de inverno . Minha mãe me tomou pela mão , trancou a porta do sobrado de pastilhas rosas onde morávamos ali no Jardim Maristela. Conferiu duas, três vezes se tudo estava bem trancado,  repetindo um antigo gesto de meu pai. Respirou fundo com seus pulmões de asmática, atravessou o curto e triste jardim e olhou pra via Anchieta bem decidida. O ar cheirava a Orniex, Eveready, fábricas de poluições múltiplas que apodreciam o ar daquela região. 
     Subimos um pequeno barranco que dava acesso ao acostamento da estrada e quando ali chegamos ofegantes percebi que minha mãe tremeu um pouco pois o movimento era maior do que o esperado. Todo o progresso imundo e fedorento do qual muitos paulistanos se gabavam descia sem glórias para o porto de Santos no lombo dos caminhões pesados quando decidimos- minha mãe e eu – que era hora de atravessar a via Anchieta para pegar o ônibus do outro lado da estrada. Sentido vila Arapuá, São João Clímaco. Minha mãe agarrou minha mão com tanta força que senti suas unhas miúdas entrarem na palma de minha mão esquerda. Atravessamos correndo e torcendo pra que nenhum caminhão desgovernado nos colhesse no meio daquela curva tenebrosa que eu via pela metade da janela do meu quarto.(...)

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