um mergulho a esmo no fundo da Colômbia

     Quero ter assim a oportunidade de lhes contar de uma mãe que encontrei no sul da Colômbia defronte a uma tosca pousada em Los Pozos. Pequetita, gordinha, moletom e sandálias baratas nos pés , não mais que 35 anos, ela se aproximou de mim sob uma cobertura de folhas de zinco numa manhã chuvosa perguntando se eu podia ajudá-la a encontrar sua filha.
Como poderia eu, brasileiro perdido naquele canto do mapa, ajudá-la a encontrar a filha sumida ? A senhorinha disse que havia me observado no dia anterior conversando com guerrilheiros que dominavam aquela região e viu  que até trocamos apertos de mão e dividimos uma cerveja venezuelana. Logo eu , brasileiro, perdido, mestiço e desconectado era conhecido da guerrilha e podia ajudá-la sim no seu intuito de ter sua filha de volta.
Dois anos antes sua filha havia se embrenhado mata adentro com guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia e nunca mais havia dado noticia. Isso havia sido no outro extremo do país e essa mãe gordinha e ansiosa , essa mãe de sandálias baratas e choro incontido percorria longa viagem país adentro tentando ter noticias de sua filha, provável guerrilheira das Farc.
Assim, por armadilhas postas pelo destino, essa mãe me implorava que eu chegasse perto de um dos meus "amigos guerrilheiros" e perguntasse por sua filha. Dizia isso fungando e tirando do bolso de sua pobre calça um saco  plástico transparente com documentos e fotos antigas da filha que deixou o lar e parecia uma moreninha simpática e risonha envolta na aura da adolescência esperançosa da qual teriam se aproveitado os guerrilheiros para seqüestrá-la contra sua vontade.
Estávamos protegidos da chuva que não parava sob esse toldo simples de folhas de zinco e enquanto conversávamos uma vaca era esquartejada bem ali na nossa frente . Os pedaços maiores eram colocados num carrinho de mão quando parou bem em frente de nós um jipe azulado de onde desceu Mariana, guerrilheira de alta patente que eu já conhecera de outras charlas. Mariana ia comprar um pedaço daquelas carnes esquartejadas quando me viu e me saudou . Respondi a seu aceno e lhe chamei . Veio até mim conformada , parecia ter pressa. Com pressa também lhe apresentei a mãe aflita que aos prantos repetiu para a guerrilheira a história que havia me contado.
Mariana, apesar de contrariada, ouviu com atenção toda a história da mãe aflita. Ao final do relato pegou a foto da menina sumida , observou bem e anotou o nome dela. Prometia pra mais tarde uma posição a respeito do assunto. Levantou-se depressa, pegou seu enorme pedaço de carne , entrou no jipe e partiu . Eu tomava agora um Pony Malta bem docinho e olhava impassível para a cara daquela mãe chorosa. Estendi-lhe um lenço de papel e ela mal e mal enxugou os olhos enquanto uma chuva pesada desabou sobre todos nós.

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