Brusco despertar e o coveiro de Marx

túmulo de Karl Marx em Highgate, Londres
      Sem querer acordei implacavelmente cedo hoje incomodado pelo Alzheimer paterno ter deixado vestígios em mim em virtude de  não me lembrar de um livro que recentemente li e para o qual fiz modestos apontamentos. Esse assustador lapso de memória recente me fez percorrer com olhos e dedos a estante de casa e a cabeceira da cama em busca do livro esquecido. Assim casualmente me deparei com a singela informação, embutida num livro -almanaque de Eduardo Galeano, que no dia de hoje, 14 de março , mas no ano de 1883, era sepultado em Londres , "na presença de uma multidão de 11 pessoas, contando o coveiro" um homem sobre o qual milhões debatem até hoje e cujas idéias ainda causam celeuma ainda mais nessa extemporânea guerra fria que vivemos. Karl Marx era o nome dele.
        No livro que achei Eduardo Galeano garante que a mais famosa frase de Marx está em seu epitáfio : " Os filósofos interpretam o mundo, de várias maneiras; mas a questão é mudar o mundo".  Na perspectiva de Marx é difícil saber se o mundo foi mudado. Hoje sequer sabemos se ele está transformado ou transtornado. Marx repousa em Highgate que não conheço mas me lembro de entusiasmado relato sobre o recanto que me foi enviado via uma carta remota pelo amigo Marco Piquini que morou em Londres um período de sua vida. Não sei se eu queria ter ido visitar o túmulo de Marx como fiz com o de Chopin em Paris. Aquela velha aparência - Marx nasceu velho ? - de olhar senhorial e barba cerrada sempre me causou sinistra impressão como é sinistro pensar que a pretexto de defender ou combater as idéias dele tanto sangue tenha se derramado. Sobre seu "O Capital" ele teria dito, ainda segundo Galeano, que  " ninguém escreveu tanto sobre o dinheiro, tendo tido tão pouco dinheiro. O capital não vai pagar nem os charutos que fumei enquanto escrevia ".
     Nesse dia, 130 anos após o sepultamento de Marx, não fica nem bem repetir aquele bolodório sobre falência de ideologias, capitalismo, socialismo, globalização e neo-liberalismo. Mas é curioso notar que as vozes da noite eterna que sempre vagam pelo Brasil , e nesses tempos com força, sempre buscam no velho Marx motivos para justificar seus argumentos trevosos. Se Marx não foi a vanguarda do desenvolvimento do pensar humano não o serão essa vanguarda do atraso que belicosa se arma sempre contra as conquistas da sociedade civil. Acordei cedo hoje só para ter certeza, mais um dia, que no Brasil se vive ainda a guerra fria.

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