A FRANÇA PELA PORTA DA DIREITA


Diante da porta da Assembleia Nacional da França , de onde se originaram os termos "esquerda" e "direita" conforme o posicionamento político dos frequentadores da casa, fico a pensar num paradoxo atual dos franceses que é incompreensível para um estrangeiro como eu, mero comedor turístico de queijos e baguetes.


A extrema-direita francesa, comandada pela abominável Marine Le Pen, venceu as eleições locais para o parlamento europeu, deixando estupefato pensadores, jornalistas, escritores, intelectuais e boa parte da opinião pública francesa. Paradoxo incompreensível para mim é que isso ocorre exatamente no momento em que a mesma França lembra por esses dias os 70 anos do "Dia D", o gigantesco desembarque nas praias da Normandia que começou por libertar o país do jugo opressor nazista. Ou seja, comemoram a libertação da mão dos nazis mas votam nos candidatos quase nazis (alguns totalmente) da Frente Nacional de madame Le Pen.

Desemprego, insegurança, medo das ações econômicas de mão forte da senhora Merkel que não dá moleza aos parceiros da União Européia jogando o jogo só dela? Quais os verdadeiros motivos dos franceses terem dado a vitória a abominável madame Le Pen? Analistas das tvs locais garantem que isso só ocorreu pelo absoluto desinteresse dos franceses nessa eleição de 25 de maio. Se lixaram para as eleições do Parlamento Europeu e agora vão ter que paga o pato de não só uma Frente Nacional mais forte como uma madame Le Pen mais musculosa eleitoralmente para as próximas eleições presidenciais francesas.

Há muitos europeus inteligentes – como um prezado amigo espanhol que mora atualmente no Brasil – que não consideram madame Le Pen tão perigosa ainda. Talvez falte a mim, pobre mortal latino-americano, essa percepção europeia já que essa senhora e seu discurso me assusta horrores. Especialmente quando ainda tenho os tênis sujos da areia da praia de Omaha, Normandia, onde tantos tombaram para destruir o que essa senhora enaltece. O patriotismo sombrio, o individualismo exacerbado, uma União Europeia detonada e uma "França forte e para os franceses", como ela vive dizendo. Já vimos mesmo esse filme antes. E não fazem 70 anos. Ou estarei exagerando?
*Ricardo Soares é diretor de TV, escritor, roteirista e jornalista. Titular do blog Todo Prosa (www.todoprosa.blogspot.com) e autor, entre outros, dos livros Cinevertigem, Valentão e Falta de Ar. Atualmente diretor de Conteúdo e programação da EBC- Empresa Brasil de Comunicação.
( publicado originalmente no portal DOM TOTAL)

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