MEU ENCONTRO COM EDUARDO CUNHA

   

   Dia desses essa crônica foi publicada no portal DOM TOTAL.(Clique aqui)  Diante do fétido ar político que persiste e continua ela se mantém atual porque Eduardo Cunha, para nossa tristeza, continua poderoso e comentado. Por isso a republico. Triste é o país cujo governo vira refém de tão lamentável personagem. E que para fugir de seus males tem que cair no colo de outro cidadão execrável, o inominável Renan Calheiros. Está cada vez mais difícil explicar para as crianças o que é "honestidade" . Bons tempos em que só as nulidades triunfavam no Brasil.


MEU ENCONTRO COM EDUARDO CUNHA




Por Ricardo Soares*

    Estou caminhando na avenida República do Líbano em São Paulo. Em direção ao Parque do Ibirapuera. Creio que é um sábado de manhã em anos passados. Faz sol e estou feliz e contemplativo. Súbito sai de dentro de uma casa elegante, diria que quase saltitante, o senhor Eduardo Cunha já um deputado que atuava nas sombras mas com bastante contundência. Vestia um arremedo de roupa esporte e não sou maldoso ao dizer que a gordura dos seus cabelos serviria para passar uns bons bifes.
    Sorridente malévolo como só ele sabe ser o deputado me saúda com a mão direita. Sempre a direita. Contido porém loquaz, fui claro? Fico sabendo que estava saindo de uma reunião onde dava uma “mãozinha” para a campanha daquele coroinha político chamado Gabriel Chalita que gostaria de ter sido prefeito de São Paulo. O rapaz fenômeno que entre o momento em que desperta até a hora de dormir escreve uns seis livros completos recheados de estultices de auto-ajuda cobertos com glacês de frases feitas.
   Naquele momento o Eduardo Cunha estava empanzinado da literatura “chalitiana” e precisava urgente de um café com sal de fruta para se desintoxicar. Logo ao lado da casa de onde ele havia saído tinha um café improvisado onde se vendia também água de coco e esfihas fechadas. Sentamo-nos defronte a uma mesinha e Eduardo Cunha, um guardião da ética e bons costumes políticos , disse que tinha muito apreço por algumas figuras capitais e cultas na nossa política como o senhor José Sarney, escritor que ao lado de Nelida Pinõn ocupa o panteão da insignificância literária muito falada mas jamais lida. Ok. Por aqueles dias Cunha vinha tentando, sem sucesso, ler as mal traçadas de Sarney e ao saber que eu gostava de literatura me pediu uns conselhos que eu não soube dar. Perguntei ao nobre deputado porque se atribuía flagelo tão doloroso lendo Sarney e ele me disse que “tinha grandes planos para o futuro. Se o Sarney pode, por que não posso?”
   O sol batia plácido em nossos rostos e então passamos a assuntos literários mais amenos como a discussão sobre a poesia de e.e cummings e toda a obra de Derek Walcott que são autores chiquérrimos de serem citados muito embora ninguém os tenha lido apesar de suplementos literários mal escritos dizerem o contrário. Eduardo Cunha pareceu saber bastante sobre esses autores mas fez questão de deixar claro que ama a poesia concreta brasileira que cimenta os seus papos sobre logística. No entanto também deixa um canto do seu coração para a poesia de Ferreira Gullar, grande amigão de Sarney.
   Exauridos com esse papo muito erudito nos despedimos pois ele tinha que pegar um vôo logo mais para voltar ao Rio de Janeiro, sempre em busca de seduzir as massas com sua fina estampa bacana e seu discurso que sempre quis apenas o bem do Brasil. Quando a porta do táxi bateu eu vi que Eduardo Cunha na verdade não era Eduardo Cunha e que ter caminhado naquele sol me fez ter uma frugal alucinação. Tudo que eu imaginava ter vivido fora uma miragem. Que pena. Tudo me pareceu tão sólido que não se desmancharia no ar. Tudo ilusão.

*Ricardo Soares é diretor de tv, escritor ,roteirista e jornalista. Escreveu crônicas para os jornais “ O Estado de S.Paulo” , “Jornal da Tarde”, “Diário do Grande Abc”e revista “Rolling Stone”. É autor de sete livros.

Comentários

Thiago Alvez disse…
Meu caro Ricardo você está muito incisivo nessas suas crônicas, e eu estou adorando, e o pior de tudo é que o "egrégio" deputado Eduardo Cunha é oposição do atual governo e aí me vem a frase de um amigo niilista que diz: Qualquer mensaleiro é melhor que essa oposição.

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