É o triste fim da comunicação pública ?

     


    A comunicação pública brasileira nunca esteve tão ameaçada. Desde que a Tv Cultura de São Paulo se descaracterizou , transformando-se numa plataforma do nefasto ideário tucano -paulista, as esperanças convergiam para o intrincado processo que gerou a EBC que gere dois canais de televisão, oito rádios e portais de notícias. Aos trancos e barrancos ela vinha tentando se consolidar até que o governo golpista de Michel Temer lá instalou os seus prepostos para desmantelar o que havia sido erguido. Agora a justiça reconduz ( não de maneira definitiva ainda)  o presidente deposto, o jornalista Ricardo Melo. O jogo está sendo jogado e no meio dele cometi esse texto que foi publicado no portal DOM TOTAL e agora republico no meu blog... o original está nesse link... Clique aqui...

     Há várias gerações artistas, jornalistas, produtores culturais, pensadores e ativistas tentam levar a frente o sonho de uma rede nacional de comunicação pública. Esse sonho muitas vezes só teve como trincheira a Tv Cultura de São Paulo fundada em 20 de setembro de 1960 pelos Diários Associados e reinaugurada em 15 de junho de 1969 como Fundação Padre Anchieta com caráter público e hoje com feitio totalmente esfacelado diante dos desmandos, enxugamento e aparelhamento feitos pelos sucessivos governos tucanos que transformaram a fundação em celeiro de guerra antipetista.
Grosso modo foi a "politização" da Tv Cultura que a joga no limbo.Uma emissora que hoje não é nem sombra do que foi sobretudo no que tange a vanguardismo, inovação de linguagens e propostas, plataforma de lançamento para talentos muitos tanto diante como atrás das câmeras.
Com o fim das esperanças de que a tv Cultura pudesse representar uma rede pública de televisão que mostrasse e refletisse a diversidade do país esses anseios se transferiram para a EBC ( Empresa Brasil de Comunicação) nascida em dezembro de 2007 da união dos patrimônios e do pessoal da antiga Radiobráse da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), que coordenava a TVE Brasil. Dessa "união",infelizmente, começou a desunião e  surgiram problemas que iam da impossibilidade de gestão de muitos contratos e serviços à insubordinação de alguns antigos funcionários das duas empresas que se opunham à sobreposição da EBC.  Isso sem contar a inicial fratricida briga interna entre profissionais ligados à Secom e ao MinC que foram ocupar postos de comando na EBC e que foram fundamentais (os dois grupos) na criação e consolidação da empresa que era tão nova, mas com embates tão velhos. Esse assunto ainda hoje é tabu entre todos os envolvidos, mas a essa altura, quando o governo ilegitimo de Michel Temer pulveriza  a EBC todos perdemos.
Para resumir : não ter uma rede de comunicação pública ( sob o guarda-chuva EBC há duas emissoras de tv, nove rádios e uma agência de notícias) que reflita o Brasil fora dos anseios de mercado e dos interesses dos grandes grupos da mídia é simplesmente um retrocesso inimaginável. Dá espaço a corrente hegemônica tanto reforçada do triunfo do "deus mercado" sempre com todos os olhos na audiência e nenhum no interesse coletivo. É nivelamento por baixo.
A EBC foi um processo de construção coletiva  mas muitas vezes perdeu-se em brigas por espaços de poder. Assim  todos perderam e muitos desses embates resultaram na falta de direcionamento da empresa e no seu consequente enfraquecimento . Ou seja, o também pouco apreço dos governos petistas para discutir a comunicação pública no Brasil acabou por dar mote para os golpistas agora colocarem todo o projeto abaixo. As forças que "disputaram" antes na EBC e se digladiaram agora morrem juntas e abraçadas. E dos criativos aos burocratas que queriam o melhor para a EBC todos ficamos estupefatos com a truculência com que se tomou de assalto esse sonho de comunicação pública que ao demorar pra se consolidar deu espaço para ser golpeado de morte. Urge que essas forças se aglutinem de novo, se organizem e pensem na viabilidade de reconstruir um projeto de comunicação pública efetivo como acontece na França, Inglaterra, Alemanha. Modelos tão citados, mas jamais copiados. Não é possível que após tantos erros não possamos refletir sobre as nossas diferenças para formarmos uma nave de resistência contra um projeto abjeto que agora aposta firme e forte no emburrecimento coletivo da nação para galgar os seus mais desprezíveis intentos. Quixotescamente eu ainda acredito em comunicação pública . E por ela vou brigar sempre já que nela passei grande parte de minha vida profissional.
*Ricardo Soares é roteirista, diretor de tv, escritor e jornalista. Dos 38 anos de atividade profissional passou mais da metade na comunicação pública onde foi ,entre outros cargos, diretor, roteirista e apresentador de programas e documentários na Tv Cultura e diretor de conteúdo e programação na EBC.

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