O que 1971 pode ensinar a 2017

   
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    Meados de 1971. O Brasil tinha sido campeão mundial de futebol um ano antes e eu adorava Pelé  e Jairzinho e uma bicicleta que tinha ganho no Natal anterior e era azul e branca, da marca Monark. Na verdade era uma Monareta , um modelo da Monark para meninos. Eu desbravava com ela toda a vila Paulicéia em São Bernardo do Campo, ABC paulista .Subia e descia morros, entrava e saia de campinhos de futebol, a arrastava pelos bambuzais e trilhas que davam no Jardim Canhema que no futuro viria a ser um bairro violentíssimo de Diadema onde morreu um menino chamado Fernando Ramos da Silva que ficou famoso no cinema fazendo o papel de Pixote.
   Naquela época o Pixote não tinha nascido e a gente entrava nos bambuzais para pegar bambu para fazer papagaios e pipas. Hoje tudo aquilo virou uma devastação completa tomada por industrias de carros e caminhões que sepultaram bambuzais, rios, riachos, campinhos de futebol .Lembro que hoje existe uma horrível avenida onde eram um daqueles bambuzais . E quando ali volto, muito de vez em quando, não vejo mais moleques nas ruas e fico tentando me achar no meio daquele cimento todo.
  Mas como eu ia dizendo parece que tinha muito mais mato do que de fato devia existir naqueles tempos. É que como hoje não tem mato nenhum para mim qualquer mato naquela  parece uma floresta de sapos e rãs que viviam a pular em dias que pareciam ser muito mais claros e ensolarados. Eu tinha poucos medos e o futuro pra mim era apenas uma caixinha cheia de miudezas.
  Diante dessas miudezas, cacos de uma infância já remota, eu não sabia as agruras que o país passava. Ditadura, esse nome maldito que hoje é pronunciado com ênfase por muitos que desconhecem o que se passou em 71 e outros anos onde os militares mandavam, prendiam e arrebentavam. Triste quem vai às ruas hoje pedir pela volta de um regime de força. Mas eles não sabem o que fazem na medida em que não estudaram , não leram , não viveram aqueles tempos. Mais triste é ver os contemporâneos nessa  mesma farsa. Gente que sabe o que aconteceu e , mesmo assim, exalta a força, a autoridade, o machismo e o cabresto.
    Não são poucas as teorias que se espalham pelo planeta no início de 2017 dando conta dessa espantosa escalada autoritária e conservadora. Não tenho a menor pretensão de entender os motivos . Prefiro crer, como os espíritas, que é karma. Karma coletivo. Por outro lado se faço a despretensiosa evocação de lembranças de 1971 é na esperança de que um estilhaço desse ano nos ensine no aqui e agora, em 2017. Para que a gente não repita os mesmos erros e evoque o que não deu certo .Não tem a menor graça voltar aos valores arcaicos do passado, sepultar conquistas e esquecer as utopias. Quem vive assim é robô. E nós não viemos ao mundo para isso.
Publicado originalmente no DOM TOTAL... Clique aqui

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